terça-feira, 19 de maio de 2009

ORNITOLOGIA (parte XV)

OBSERVAÇÃO DE AVES
Estuário do Cávado


Em contraste com a extensa ordem das aves que estamos prestes a abordar e que familiarmente conhecemos por pássaros, ainda nos vamos ficar entretanto com uma série de outras que, representadas apenas por uma ou duas espécies, desenvolveram hábitos e apresentam aspectos gerais tão peculiares que quase nos fazem acreditar estarmos perante autênticos exotismos. No entanto, embora quase todas elas nos visitem somente na Primavera e no Verão, oriundas da quente África, fazem efectivamente parte da multiplicidade da nossa avifauna.


Ordem Cuculiformes

Família Cuculidae
(uma espécie)


Cuculus canorus (Cuco)

1 – (Estatuto de conservação) Pouco preocupante;
2 – (Quando observar) Começam a fazer-se ouvir em meados de Abril e regressam para as zonas de invernada mais a sul nos finais de Agosto e Setembro; por cá, particularmente junto à costa, tudo leva a crer que são apenas vistos indivíduos em migração de passagem, contudo, parecem estabelecer-se como aves estivais reprodutoras nas vertentes a nascente dos montes do nosso concelho (ver ponto 5);
3 – (Abundância) Pouco comum, mas na mancha florestal dos Montes de Faro e S. Lourenço será menos raro;
4 – (Espécies parecidas) Apesar da distintiva cauda comprida, bem notória enquanto as aves estão pousadas, é costume surgirem-me dificuldades na sua identificação, sobretudo se forem observadas em pleno voo; não serão de estranhar possíveis confusões com espécies tão diversas como o Pombo-da-rocha, o Peneireiro-vulgar e o Gavião ou até o Noitibó (ver a seguir), valendo-nos o facto destas aves serem habitualmente detectadas enquanto emitem os seus cantos tão característicos – aquela onomatopeia que todos conhecemos;
5 – (Habitat e circunstâncias em que se observam) Sendo tímidos e escassos por estas paragens, torna-se mais provável encontrá-los através do seu canto, tantas vezes repetido de modo prolongado, do que propriamente através do avistamento directo; assim, apenas foram detectados alguns indivíduos na zona do pinhal e mata de folhosas que contornam os campos agrícolas entre Fão e a “lagoa” da Apúlia, sobretudo, nas imediações de terrenos não cultivados e alagados e charcos onde se desenvolve densa vegetação ripícola; de salientar que quando pousam num ramo ou fio, aparentam terem dificuldade em equilibrarem-se, o que os faz balançar a longa cauda, baterem as asas e, consequentemente, exporem-se um pouco mais;
6 – (Tolerância à nossa presença) Parecem desenvolver uma tendência natural para evitarem zonas mais urbanizadas e, embora se deixem observar demoradamente, não é hábito permitirem aproximações inferiores a 60 ou 70 metros;
7 – (Outros dados de interesse) Para efeitos reprodutivos estas aves são consideradas parasitas, ou seja, põem os ovos nos ninhos de outras, em regra muito mais pequenas, como as alvéolas, as felosas ou os rouxinóis, portanto, estando tão intimamente associadas a estas espécies, será de esperar que frequentem o mesmo tipo de habitats onde as hospedeiras nidificam (p. ex. caniçais ou outras zonas húmidas e áreas agrícolas vedadas com sebes).


Ordem Caprimulgiformes

Família Caprimulgidae

(uma espécie)


Caprimulgus europaeus (Noitibó)

1 – Vulnerável e consta no anexo A-I da Directiva Aves;
2 – Estival;
3 – No sistema agro-florestal entre Fão e Apúlia desenvolver-se-ão boas condições para a sua ocorrência, todavia, através da minha observação directa não disponho de dados que me permitam avaliar a sua abundância na região;
4 – Enquanto voa poderá ser confundido com o Peneireiro-vulgar ou o Cuco que já deverão estar a pernoitar à hora em que o Noitibó se dedica à caça de borboletas nocturnas;
5 – Assim como deixei referido para a Coruja-do-mato e para o Cuco, também estas aves são mais facilmente ouvidas do que vistas; a sua vocalização é aquele IRRRRRRR incessante que ouvimos nas noites quentes de Verão um pouco por todas as áreas verdes, nomeadamente, a orla do estuário, as dunas e as clareiras da floresta, mas atenção para não confundirmos esse som com o que é emitido pelas Relas (anfíbios) nas zonas alagadas ou húmidas; no meio natural, quando estão pousados, é praticamente impossível de perceber a sua presença, tendo em conta que a sua plumagem se confunde com as folhas ou a casca dos ramos das árvores em que se abrigam e descansam; no entanto, naquelas raras ocasiões em que detectamos uns vultos a esvoaçar logo após o pôr-do-sol enquanto o céu ainda está claro, não é difícil de os identificarmos, uma vez que ao crepúsculo, além dos morcegos, não haverão outras espécies aladas a perseguirem insectos em voos tão velozes quanto acrobáticos, quase que às cambalhotas; aquela zona de pinhal rarefeito logo atrás das dunas primárias entre a capela da Sra. da Bonança e as Pedrinhas, ou então o limite sul da mata junto à “lagoa” na Apúlia são, naquelas circunstâncias e com as temperaturas mais elevadas a trazerem maior abundância de insectos, os locais mais propícios para a observação destas aves;
6 – Conforme o que expus no ponto anterior, não será tarefa fácil fotografá-los;
7 – Esta espécie é muito sensível ao uso excessivo de pesticidas na agricultura e, além disso, pelo que se verifica na estrada que liga Ofir a Cedovém, os atropelamentos também poderão estar a contribuir para o declínio das suas populações.


Ordem Apodiformes

Família Apodidae
(uma espécie)


Apus apus (Andorinhão-preto)




























































1 – Pouco preocupante;
2 – Estival, a sua chegada começa a ser mais notada já em Abril, em Outubro ainda restam por cá em número considerável e os últimos partem só em Novembro;
3 – Abundante;
4 – Podemos encontrar algumas semelhanças com as andorinhas em geral, mas são menos corpulentas e têm as asas mais curtas; o congénere Andorinhão-pálido (Apus pallidus) não deverá ocorrer na nossa região, contudo, esse facto não deve excluir em absoluto a possibilidade de acidentalmente nos visitar;
5 – Distribuem-se amplamente por todas as povoações do litoral norte do País, especialmente as mais densamente urbanizadas, sendo facilmente observados a sobrevoar os nossos telhados e torres em grupos mais ou menos concentrados, em particular ao final da tarde quando emitem aqueles ruidosos chamamentos agudos;
6 – Só pousam praticamente já no interior dos ninhos, em cavidades, onde ficam fora do nosso alcance visual, portanto, embora não seja raro passarem-nos quase por cima da cabeça em voos rasantes, teremos de ter alguma pontaria para os conseguirmos “atingir com um tiro” das nossas lentes; por vezes, nas perseguições que movem aos insectos, de que se alimentam, chocam com os fios de alta tensão que atravessam as nossas povoações e, em particular aqueles que se prolongam por toda a zona ribeirinha de Fão, têm sido causa para muitos acidentes envolvendo várias espécies distintas – nas fotos que acompanham este texto podem ver uma das vítimas daquela ameaça, a qual, após algumas horas de repouso e tratamento, recuperou e seguiu destino;
7 – Há autores que os identificam, juntamente com o Falcão-peregrino (Falco peregrinus), como as aves mais velozes do mundo, alias, o seu corpo parece ter sido criado unicamente para voar – o seu nome científico significa literalmente “sem pés”, contudo, embora estejam muito juntos ao abdómen, dispõe obviamente desses membros.


Ordem Coraciiformes

Família Alcedinidae
(uma espécie)


Alcedo atthis (Guarda-rios)











































1 – Pouco preocupante, consta no anexo A-I da Directiva Aves e está definida como espécie de conservação prioritária para o Parque Natural Litoral Norte;
2 – Neste estuário, onde comprovadamente se reproduzem, deverão ocorrer vários tipos de populações distintas – uma residente, uma invernante e outra migradora de passagem; os meus registos de avistamentos oscilam consideravelmente de estação para estação e mesmo de um ano para o outro; é costume ocorrer uma diminuição que se nota a partir de Março até Julho;
3 – Embora sejam observados com frequência pelas ínsuas e nas margens do Cávado, a sua população será pouco numerosa;
4 – Ímpar, nenhuma espécie se assemelha a esta;
5 – Encontram-se habitualmente empoleirados nos ramos ou estacas ao longo das margens do Cávado, logo acima do plano de água (por vezes nos juncos); quando está em actividade a capturar peixe, de que se alimenta, muitas vezes atira-se para cima a partir da base onde está pousado, peneira sem se deslocar de um ponto quase fixo no ar e de seguida mergulha de cabeça como uma seta, apanhando a presa com o bico; quando dois indivíduos se encontram, geralmente segue-se uma série de vocalizações como “apitos” agudos e sibilantes; apesar das suas cores vistosas, quando permanecem imóveis passam-nos muitas vezes despercebidos; nos Invernos mais rigorosos podem ser observados junto aos charcos que se formam com as chuvas na mata de pinheiro e folhosas entre Fão e Apúlia; também frequentam as praias marítimas rochosas do litoral norte;
6 – Muito tímidos; a multiplicação de excelentes fotografias que se vêm pela web, devem-se à muita persistência e paciência dos seus autores que se valem do facto dos Guarda-rios procurarem pousos previsíveis onde permanecem a descansar por longos períodos de tempo;
7 – Esta é sem dúvida uma das espécies mais cintilantes da nossa avifauna, cujas cores azul-vivo, azul-esverdeada e laranja emprestam um ar exótico às margens do Cávado; a única espécie que se lhe compara no colorido será o Abelharuco (Merops apiaster), cuja presença nunca foi por mim detectada na região, apesar da sua ocorrência constar na Lista de Aves referenciadas para o Parque Natural Litoral Norte.


Família Upupidae
(uma espécie)


Upupa epops (Poupa)
























1 – Pouco preocupante;
2 – Migrador de passagem; apesar de poder ser registada a ocorrência de um ou outro indivíduo durante toda a época estival, normalmente observam-se em Março, Abril e Maio e, posteriormente, já no final de Agosto e Setembro;
3 – Pouco comum;
4 – Aspecto geral incomparável com qualquer outra espécie;
5 – Enquanto voa torna-se impossível não reparar no relativamente lento abrir e fechar das asas listadas de preto e branco; quando está pousada no solo entre vegetação rasteira num vaivém laborioso à cata de insectos e das suas larvas, que aliás é o seu comportamento mais habitual, torna-se mais discreto; a partir desta última situação, normalmente detecta a nossa presença ainda antes de nós mesmos as avistarmos e logo levanta voo para o ramo de uma árvore próxima; não é raro serem vistas pela beira Cávado, tanto no prado juncal ao longo de toda a margem esquerda, como também nos campos agrícolas do lado oposto; ainda frequenta as dunas, a orla de todo o sistema agro-florestal entre Fão e Apúlia e não exclui algumas visitas aos jardins das casas do núcleo turístico de Ofir;
6 – Esquiva, mas permite aproximações na ordem dos 50 metros; talvez com um pouco de cuidado seja possível fotografá-las com algum sucesso;
7 – Devido, entre outros aspectos curiosos, à sua crista e ao apelativo contraste resultante do fundo amarelo alaranjado sobre o preto e branco das asas e da cauda, é sem dúvida uma das aves de eleição para os fotógrafos da natureza, mas por cá já ninguém as livra da má fama dos seus ninhos serem mal-cheirosos; felizmente, esta característica tem mantido afastados grande parte dos, ainda incompreensivelmente existentes, pilhadores de crias.