Família Gaviidae
Os
últimos dias de novembro já anunciavam o invulgar fluxo de Mobelhas (família Gaviidae) que se verificaria nas semanas
seguintes um pouco por toda a faixa costeira portuguesa. As três espécies desta
família que ocorrem no território nacional são aqui consideradas invernantes
raras ou acidentais e o número de registos conhecidos destas aves no litoral de
Esposende é tão escasso que se resume ao avistamento de uma mobelha-pequena (Gavia stellata) em frente à foz do
Cávado em 06.12.2004 (por Gonçalo Elias) e de duas mobelhas-grandes (Gavia immer), uma em janeiro de 2007 (in Noticiário 264) e outra entre 24.12.2010 e
01.01.2011, por mim observada neste estuário e sobre a qual desenvolvi aqui
um pequeno texto.
Mas, conforme
referi, no último inverno estas cifras viriam a sofrer importantes alterações. Após
Thijs Valkenburg me ter informado de que
no dia 1 de dezembro tinha avistado uma mobelha-pequena (Gavia stellata) a passar em voo para sul
relativamente perto da restinga do Cávado, passei a dedicar-me ao registo
fotográfico de aves “suspeitas” que surgiam sobre o mar. Então, na manhã do dia
7 de dezembro de 2012 passou um
indivíduo no mesmo sentido entre os recifes e a praia, permitindo-me algumas
imagens que, apesar da longa distância, revelavam caraterísticas suficientes para
identificar a ave.
Submetidas
à apreciação no Fórum Aves,
estas imagens causaram um consenso que veio de encontro à minha convicção, ou
seja, estava perante o meu primeiro registo de uma Mobelha-pequena (Gavia stellata), neste caso um juvenil. Em menos de um
mês, outro indivíduo desta espécie foi por mim detetado na foz do Cávado, mas
este registo já só constará na lista das aves observadas em janeiro de 2013. A União Internacional
para a Conservação da Natureza (IUCN) atribuiu o estatuto de conservação global
de «Pouco Preocupante» a esta espécie de ampla distribuição no hemisfério
norte,
Assim,
apenas me resta observar na minha área em estudo a Mobelha-árctica também
conhecida por Mobelha-de-garganta-preta (Gavia arctica). Em relação à mobelha-grande
(Gavia immer), não foram necessários
muitos dias para observar a primeira de três que acabariam registadas até ao
início de janeiro. No dia 15 avistei uma na margem do juncal voltada para a
doca de pesca.
No
dia 26, acompanhado por Thijs Valkenburg, Fábia Azevedo e Flávio Oliveira,
observei um juvenil entre o juncal e a restinga
que ali se manteve durante várias semanas.
E, entretanto, mais mobelhas haveriam de aparecer ...
Confirmação da
ocorrência de uma nova espécie de GRUIFORMES
Família Gruidae
Melhor
do que com palavras, apresento, antes de mais, um mapa de distribuição da mais
recente espécie de ave arrolada para o estuário do Cávado.
Esta
imagem, extraída do portal da IUCN, corresponde à área de ocorrência do
Grou-comum (Grus grus) na Península
Ibérica onde, segundo Catry P., Costa H., Elias G.
& Matias R. em AVES DE PORTUGAL – ORNITOLOGIA DO TERRITÓRIO CONTINENTAL, “… são aves associadas aos grandes espaços
com baixa ocupação humana e relativamente abertos do interior sul de Portugal”,
portanto, em nada parecidos com os habitats que podem encontrar no litoral
norte.
Foi,
pois, com toda a perplexidade que recebi a comunicação do Sérgio Esteves referente
ao avistamento de um juvenil desta espécie que no dia 13 de dezembro de 2013 sobrevoou o juncal ao largo de Esposende e,
sem pausas, seguiu na direção do mar até sair do seu alcance visual. Nas
circunstâncias narradas e considerando que aquele é o mês em que se verifica o
maior número de chegadas a Portugal destas aves provenientes da Escandinávia ou
de outros países do norte da Europa, onde se reproduzem, julguei que a ave
tinha simplesmente desenhado uma rota errática, mas que naturalmente continuaria
à procura de um dos seus locais tradicionais de invernada no Alentejo. Não
obstante, ainda naquela data, contornei todo o estuário e a área agrícola que
se estende para nascente até à arriba fóssil, mas nem um vislumbre tive de tão
grande ave, admitindo, assim que jamais a pudesse vir a localizar.
Até
que, novamente no dia 26 e com os meus já referidos acompanhantes, percebemos
que um grou tinha pousado em pleno juncal. Manifestando um comportamento muito
prudente nos primeiros dias da sua “estadia”, a ave apenas se deixava
fotografar ao longe, mas as imagens revelavam que efetivamente se tratava de um
imaturo da espécie observada no dia 13.
Nos
dias seguintes, durante as várias tentativas que fiz no sentido de fotografar a
ave com melhor definição, esta afastava-se quase sempre para os tais espaços
mais abertos da zona agrícola a montante de Esposende onde parecia encontrar
abrigo e eventualmente algum alimento.
Fica
assim inscrito no meu inventário para o estuário do Cávado o Grou-comum (Grus grus), espécie bem
disseminada por vastas regiões da Eurásia, mas extinta enquanto reprodutora no
nosso país.
Apesar
de tão alargada área de distribuição global, a população invernante que nos
visita está classificada de «Vulnerável» no Livro Vermelho dos Vertebrados de
Portugal.
Além
do Grou-comum, no século XIX ainda ocorreu em Portugal o Grou-pequeno (Grus virgo sin. Anthropoides virgo), espécie que, com
excepção nalguns países de leste, praticamente se extinguiu na Europa.
A
fuga ao cativeiro deverá ser a explicação mais acertada para a ocorrência de
uma destas aves no estuário do Cávado entre outubro e dezembro de 2004 (na
última foto).